domingo, 3 de setembro de 2006

ADEUS, CARLITOS

ADEUS, CARLITOS

Durante alguns meses, criou-se uma lenda até com certa razão e com auxílio do criador de que ele era infalível e que suas apresentações deveriam espelhar algo extraordinário. A presença imponente destacava-se sobre a imensidão e a sua confiança e conduta reforçavam todas as teses de sua tremenda capacitação. Da altura de um Davi, porém, ele se transformava ao ter de enfrentar os inúmeros Golias que se lhe apresentavam, tornando-os meros coadjuvantes. Fabuloso, realizava façanhas que poucos tinham visto. Em torno dele os espaços tornavam-se maiúsculos e lhe propiciavam grandes e oportunas ações. Grandioso entre seus pares desfilava como um Midas a dourar quaisquer objetos e embelezava as molduras esportivas. Poderoso, jamais se permitia um gesto de insegurança e transmitia uma carismática e engenhosa postura. Portentoso, chegou a reforçar a tese de que o impossível sempre acontece.
Prodigioso, vestiu-se de rei e se pôs a representar um plebeu que em um golpe se fez servo de Deus e com ele se associou para pintar de metáforas as cores da vida. Excelente foi e espetaculares desempenhos apresentou, salvando a pátria em tantas ocasiões, rimou perfeito com eleito e uma unanimidade se instalou à sua volta. Até mesmo o dramaturgo Nelson Rodrigues aceitaria a idéia de que ela, a unanimidade, aqui não poderia ser burra. Genial e pouco genioso, calma e pacientemente se colocou onde pretendia, tornando-se responsável temporariamente pelo bem-estar da nação. Formidável atleta destacava-se entre tantos por seu trabalho, sua conduta altiva e sua postura especial. Sem exagero diria que, historicamente, jamais havia presenciado tamanho fervor por um estrangeiro nesta terra adubada de estrelas nativas.
Seus pés preciosos como por necessidade utilizavam discretos calçados para preservar a lisura e a ternura que estavam eternamente estampadas em sua expressão mais conhecida, ainda que transfigurada por um acidente, como se fossem extensões definitivas e sem rasuras de sua alma. Este estado de bem-estar e de satisfação prolongou-se por um longo tempo, quase eternizando sua relação com o público, nem sempre fiel. Lembro-me de vários episódios, ainda latentes em minha mente e até por culpa de uma proximidade inescapável, ocorridos nos inesquecíveis jogos em que empurrou a sua equipe a conquistar o Campeonato Brasileiro do ano passado. Em particular nas cobranças de pênalti, situação em que o grande líder é instado a comparecer sem contestação, que, invariavelmente, eram acompanhadas de expressões de absoluta confiança por seus seguidores.

Nesse momento único de um espetáculo de futebol, que normalmente tem vocação coletiva, em que a ação individual é definitivamente a responsável pelo resultado, conseguiu vários feitos extraordinários no conteúdo e principalmente por terem acontecido em ocasiões especiais. Destacava-se pela gana e vontade quando desfilava pelos gramados como que a presentear a tudo e a todos, principalmente a sua torcida, que sempre declara amor aos que dessa forma se comportam. Eis, porém, que surgiu um inimigo mortal que imediatamente passou a incomodá-lo com suas opiniões e atitudes, e nosso herói se deixou abater, passando seriamente a pensar em se afastar daquele meio e principalmente daquela situação.
O período de mais de um ano em que chegou a fazer milagres, como se fosse algo tão normal para ele e que durante o qual foi visto e tratado quase como uma divindade, pouco valeu para a dramática decisão. Podemos dizer que, infelizmente, ele reagiu da forma mais humana possível, pois nem todos conseguem conviver com a arrogância e a prepotência sem que de alguma forma se sintam impelidos a reagir veementemente. Particularmente, quem durante todo esse processo sofreu com as pressões dos que os acompanhavam e que jamais fugiu da responsabilidade. Aqui entra a questão do mérito que deve incontestavelmente servir como referência para qualquer decisão a ser tomada por qualquer comandante. Quando ele não se faz presente, provoca uma onda de insatisfação em seus subordinados difícil de ser contida.
E o nosso herói, até porque possui uma independência que seus companheiros ainda não adquiriram, resolveu abandonar o barco que já se mostra à deriva há algum tempo, e que provavelmente enfrentará ainda grandes tempestades, e voltou para o útero que sempre o protegeu. A sua postura talvez não venha a ser entendida, mas pode e deve ser respeitada. Adeus, Tevez.
(artigo publicado por Dr. Sócrates na revista Carta Capital -28/08)

Um comentário:

Anônimo disse...

É complicado falar sobre esse assunto, pois tem muita coisa que não sabemos bem, mas uma coisa é certa, o SPORT CLUBE CORINTHIANS PAULISTA é e sempre será maior que qualquer jogador ou dirigente que passe..

Posso estar sendo ingrato, mas MARI, vc sabe bem, pois me conhece, então digo... JÁ VAI TARDE........